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Interpretação das Escrituras

INTRODUÇÃO
Não é raro ouvirmos interpretações variadas de uma passagem de escritura - ou uma contextualização diversa de um discurso de uma Autoridade Geral. Alguns usam certas passagens para comprovar pontos políticos ou para apontar erros na crença de outrem.
"No septuagésimo nono ano [do Governo Nefita] começaram a surgir muitas contendas. Aconteceu, porém, que Néfi, Leí e muitos de seus irmãos que conheciam os verdadeiros pontos da doutrina, recebendo diariamente muitas revelações, pregaram ao povo, de modo que puseram fim às suas contendas nesse mesmo ano.” (Helamã 11:23)
Certamente não foi a primeira vez que “disputas relativas a pontos de doutrina que haviam sido estabelecidos pelos profetas” surgiram. (Helamã 11:24). De fato, algumas gerações antes “muitos (...) começaram a tornar-se orgulhosos e a contender acaloradamente com seus adversários, chegando a bater-lhes; sim, golpeavam-se uns aos outros com seus punhos.” (Alma 1:22).
A má interpretação das escrituras e divergência de pontos doutrinários não leva apenas à violência: mas também ao erro, racionalização do pecado e apostasia geral.

EXAMINAR E COMPREENDER
Talvez um dos maiores problemas que haja seja o da interpretação, ou melhor, o da compreensão. Neste sentido, a passagem que realça o valor do conhecimento é pertinente: “e a Vida Eterna é esta: que [conheçamos ao Pai Celestial] por único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo” (João 17:3). Para conhecer verdadeiramente o Pai e o Filho precisamos estudar as escrituras: “Examinais as escrituras, porque vós cuidais ter nelas a vida eterna, e são elas que de mim testificam” (João 5:39). Examinar as escrituras deduz mais do que meramente lê-las.
Entretanto, examinar não é suficiente. Alma mostrou que examinar as escrituras não é tudo ao dizer: “errais muito e deveríeis examinar as escrituras [mas] se supondes que é [essa doutrina errônea em que acreditais] que elas vos ensinaram, não as compreendeis” Alma 33:2). Tanto é assim, que os judeus, mestres na letra da lei, tendo estudando diligentemente as escrituras, não compreendiam verdadeiramente seu alcance. Jacó explicou o porquê: “Mas eis que os judeus eram um povo obstinado e desprezaram as palavras claras e mataram os profetas e procuraram coisas que não podiam compreender. Portanto, devido a sua cegueira, cegueira que lhes adveio por olharem para além do marco, terão que cair, pois Deus tirou-lhes a sua clareza e entregou-lhes muitas coisas que não podem entender, pois assim o desejaram. E porque o desejaram, Deus o fez, para que tropecem” (Jacó 4:14). Ser obstinado e desprezar coisas claras e simples – e a autoridade de profetas – e procurar mistérios que estão além do alcance – acabou levando os judeus a olharem além do “marco”. Assim, eles acabaram recusando “o grande e o último e o único fundamento seguro sobre o qual [poderiam] edificar” (Jacó 4:16).
Tudo isso nos ensina que ao estudar as escrituras precisamos buscar “não errar” e não olhar “além do marco”. Nossa atitude parece estar intimamente ligada a nossa capacidade interpretativa da palavra de Deus. E é assim pois dependemos do poder do Espírito Santo para entender aquilo que foi registrado pelo Espírito Santo.
Pedro disse: “Sabendo primeiramente isto: que nenhuma profecia da escritura é de particular interpretação. Porque a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo.” (2 Pedro 1:20-21).
Essa passagem é vital para o que estamos abordando. “Nenhuma profecia de escritura” pode ou deve ser interpretada por um único mecanismo de integração hermenêutico, talvez nem mesmo por um conjunto destes - pois se "os homens santos de Deus" que "inspirados pelo Espírito Santo" profetizaram - para que entendamos plenamente o que disseram, é preciso buscar o mesmo dom.
A passagem de Pedro, poderão dizer, diz que a particular interpretação humana não é cabível contra "profecias", todavia, as escrituras não contém apenas profecias: em suas passagens há preceitos, princípios, doutrinas, histórias, analogias, etc. Poderiam os métodos interpretativos da ciência humana desvendar o real significado das escrituras que não são profecias? Acreditamos que sim ,mas não em sua plenitude, pois "um homem [pode ter] muitas revelações e [desfrutar do] poder para realizar muitas obras grandiosas, contudo, se ele se vangloriar da própria força e ignorar os conselhos de Deus e seguir os ditames da própria vontade e de seus desejos carnais, cairá e trará sobre si a vingança de um Deus justo" (D&C 3:4). Assim, um homem poderia até chegar ao ponto de conhecer muito das escrituras - seu conteúdo e significado - mas o orgulho lhe faria agir contra os próprio princípios essenciais da Palavra de Deus. Se cumpriria nela a passagem de 2 Timóteo 3:7, que diz que há pessoas que sempre aprendem, mas "nunca podem chegar ao conhecimento da verdade". Para elas o poder da Palavra é raro. A analise meramente secular é carente.

RETIDÃO E MISTÉRIOS DE DEUS
A busca pelo real significado das escrituras é facilitada pela retidão. De fato, é quase impossível entender a Palavra de Deus, sem viver a Palavra de Deus.  Néfi lamentou "que muitos há que endurecem o coração contra o Santo Espírito, de modo que neles não encontra espaço; portanto, lançam fora muitas coisas que estão escritas e consideram-nas sem importância" (3 Néfi 33:1).
Os mistérios de Deus - que são verdades espirituais preciosas reservadas apenas aos que guardam os mandamentos - são revelados para "aqueles que (...) temem [ o Senhor e o] servem em retidão e em verdade até o fim". A eles o Senhor prometeu revelar "todos os mistérios, sim, todos os mistérios ocultos de [Seu] reino desde a antiguidade; e por eras futuras, [dar-lhes] a conhecer a boa disposição [de Sua] vontade concernente a todas as coisas relativas ao [Seu] reino. Sim, até as maravilhas da eternidade conhecerão e coisas futuras [lhes serão mostradas], sim, coisas de muitas gerações. E sua sabedoria será grande e seu entendimento alcançará os céus; e diante deles a sabedoria dos sábios perecerá e o entendimento dos prudentes se desvanecerá. Porque [diz o Senhor] pelo meu Espírito os iluminarei, e pelo meu poder dar-lhes-ei a conhecer os segredos da minha vontade — sim, até as coisas que o olho não viu, nem o ouvido ouviu, e ainda não entraram no coração do homem." (D&C 76:5-10)
Diferente os judeus, que olharam para além do marco, os que temem e servem ao Senhor, receberão o Espírito Santo e aprenderão "linha sobre linha, preceito sobre preceito, um pouco aqui e um pouco ali". Os tais serão abençoados por darem ouvidos aos preceitos de Deus e escutarem Seus conselhos (escutar é mais do que ouvir - é aplicar!), então obterão sabedoria, e receberão mais (2 Néfi 28:30).
Certa vez, um douto advogado, extremamente preparado (Alma 10:31), questionou os profetas de Deus sobre uma duvida doutrinaria. O profeta lhe respondeu: "É dado a muitos conhecer os mistérios de Deus; é-lhes, porém, absolutamente proibido divulgá-los, a não ser a parte de sua palavra que ele concede aos filhos dos homens de acordo com a atenção e diligência que lhe dedicam. E, portanto, aquele que endurecer o coração receberá a parte menor da palavra; e o que não endurecer o coração, a ele será dada a parte maior da palavra, até que lhe seja dado conhecer os mistérios de Deus, até que os conheça na sua plenitude. E aos que endurecerem o coração será dada a menor parte da palavra, até que nada saibam a respeito de seus mistérios; e serão então escravizados pelo diabo e levados por sua vontade à destruição. Ora, é isto o que significam as correntes do inferno."
Tal passagem é uma chave para o que deseja compreender realmente as escrituras. Ela ensina, felizmente, que "muitos" - e não poucos - tem acesso aos mistérios de Deus. Porém, eles não podem divulgá-los, a não ser uma porção, segundo a atenção e diligencia dos que buscam saber e viver retamente. A passagem também contém uma seria advertência: aqueles que endurecerem o coração poderão perder até mesmo o entendimento que possuíam sobre as verdades do evangelho - e neste estado serão escravizados pelo diabo.
Para evitar tal coisa precisamos buscar a retidão: "E se vossos olhos estiverem fitos em minha glória, todo o vosso corpo se encherá de luz e em vós não haverá trevas; e o corpo que é cheio de luz compreende todas as coisas" (D&C 88:67).

PODER ESPIRITUAL
Uma outra passagem que precisa ser citada é esta: "aquele que recebe a palavra da verdade, recebe-a pelo Espírito da verdade ou de alguma outra forma? Se for de alguma outra forma, não é de Deus. Então como é que não podeis compreender e saber que aquele que recebe a palavra pelo Espírito da verdade recebe-a como é pregada pelo Espírito da verdade? Portanto, aquele que prega e aquele que recebe se compreendem um ao outro e ambos são edificados e juntos se regozijam. E aquilo que não edifica não é de Deus e é trevas." (D&C 50:19-23)
Esta última escritura mescla-se as demais para reforçar a verdade de que sem o Espírito de Deus é difícil compreender - ou interpretar corretamente. Como já explicamos pode ser até que algum conhecimento possa ser obtido sem a graça de Deus. A frase "o demônio pode citar as escrituras para justificar seus fins", atribuída à William Shakespeare, é corroborada pela passagem de Tiago que ensina que "os demônios também creem" (TJS Tiago 2:19). E tudo isso nos mostra que os condenados Filhos da Perdição podem interpretar e aprender com as escrituras - mas nunca provar seu verdadeiro poder espiritual, que conduz à Vida Eterna. 

MÉTODOS DE INTERPRETAÇÃO
Há um risco em se usar os métodos de interpretação - que é o de "confiar no braço da carne" (Jeremias 17:5, 2 Néfi 4:34). Mas isso ocorre apenas e tão somente quando esses métodos são usados de forma principal e exclusiva, sem a retidão e convite para que o Espírito Santo nos acompanhe. Se isso advir a pureza da verdade será maculada.
Aliado ao Espírito, todavia, o empenho racional interpretativo é parte importante para se cumprir a palavra do Senhor de se estudar diligentemente e de se examinar as escrituras (D&C 1:37, João 5:39, 1 Néfi 10:19, Mosias 1:7, Alma 17:2, 3 Néfi 23:1).
Há muitos métodos de interpretação e mecanismos para se buscar a verdade. Citaremos alguns:
  • Interpretação Teleológica. Trata-se de uma interpretação finalística, que pretende, portanto, conhecer os objetivos das passagens. Decifra-se cada versículo tendo em mente o propósito do escritor. Por exemplo, Mateus estava escrevendo para quem? O que ele queria demonstrar? Qual seu propósito? Essas perguntas ajudam a conduzir o leitor pelas veredas que o autor traçou. E ajudam a explicar a razão pela qual Mateus acrescentou ou deixou de acrescentar algo sobre o Ministério de Cristo em comparação aos outros evangelistas.
  • Interpretação Sistemática. Levando em consideração que Deus não mente, e que a verdade é una, a interpretação sistemática é uma das melhores maneiras de analisarmos as escrituras. Trata-se de uma ferramenta que nos ajuda a averiguar que o evangelho não se contradiz. João, o Teólogo, em Apocalipse, por exemplo, não inova (no sentido de criar novas doutrinas e princípios), mas repete as verdades divinas - citadas abundantemente em outras passagens. Evidentemente, que cada livro das escrituras contém suas peculiaridades - mas elas, vistas em conjunto, formam um belo mosaico harmônico e racional. Usar um conjunto de escrituras em vez de um livro ou versículo isolado permite-nos entender a mente de Deus. Analisar as escrituras, separando-as em grandes temas e esquematizando-as ajuda-nos a compreender a palavra do Senhor e perceber como ela pode ser aplicada em nossa vida.
  • Interpretação Gramatical - uma das mais usadas, é útil para aprendermos o significado das palavras que os tradutores decidiram dar. E aliada a ela podemos comparar outras versões das escrituras em outros idiomas - especialmente àqueles que possuem versões mais antigas, tais como o grego, hebraico, latim e alemão. A nova edição SUD da Bíblia ajuda muito neste aspecto. Em Isaías 2, por exemplo, nas notas de Rodapé, encontramos diversos significados para palavras e expressões do original, em Hebraico.
  • Interpretação Histórica. Ao ler uma passagem é extremamente útil levar em consideração aspectos antropológicos e históricos. Embora boa parte das escrituras contenham princípios - verdades eternas - que ao serem extraídos transcendem o contexto histórico cultural de onde a escritura foi primeiramente gerada, não se pode negar que um conhecimento mais detalhado sobre o panorama social, climático, linguístico, filosófico, etc. seja relevante. Assim, por exemplo, é possivel sustentar que o povo de Mosias, ao reunir-se no Templo para ouvir o Rei Benjamim, estava reunido também para vivenciar uma importante festa da lei mosaica: a Festa das Cabanas.
  • Interpretação Ontológica. busca a essência da escritura. Busca desvendar, portanto, o que a passagem realmente quer dizer - e o que significa em sua completude. Tal interpretação é difícil em determinadas partes das escrituras. Por exemplo: Isaías utiliza-se muito do dualismo em Isaías 14:12-20 - lá ele fala tanto do rei da Babilônia, quanto do príncipe das trevas, Satanás. Assim, essa passagem ontologicamente tem dois significados distintos - ainda que semelhantes - reservados à interesses distintos. Efeito parecido ocorre nas parábolas de Cristo: as histórias em si eram apenas meios, e não fins em is mesmas - para os espiritualmente preparados, lições de grande importância eram reveladas.
Há outros métodos interpretativos, mas os que apresentei bastam para finalidade deste artigo.

7 CRITÉRIOS DE INTERPRETAÇÃO DAS ESCRITURAS.
Agora passarei a apresentar sete critérios de interpretação, extremamente úteis para que possamos extrair o verdeiro significado as passagens.
  1. CRITÉRIO DA AUTENTICIDADE. Este critério é o exame preliminar que todos devemos fazer para aceitar um texto ou discurso como Palavra de Deus. Geralmente as pessoas aceitam a Bíblia como Palavra de Deus. As três grandes religiões aceitam o Pentateuco como verdade divina, mas questionam outros textos. A credibilidade de um texto pode ser verificada pelo estudo ou pela fé - melhor os dois juntos. Livros apócrifos, por exemplo, tem o seu valor - mas não o mesmo que os livros canônicos (obras-padrão) - ver D&C 91. Um profeta, ao falar em Conferência Geral, conduz suas palavras ao nível de escrituras (D&C 68:4) - o que não acontece quando, por exemplo, fala com seus amigos de modo corriqueiro e despreocupado. O profeta Joseph Smith disse: "Eu nunca disse que era perfeito, mas não há erro nas revelações que ensinei" (History of the Church, volume 6, p. 366). Essa declaração mostra que homens imperfeitos podem ser receptáculos de verdades eternas. Pelos seus frutos os conheceremos (Mateus 7:20), ou em outras palavras, julgaremos ser autenticas as escrituras se falarem de Deus, de Sua obra e não contrariarem os princípios da verdade. A melhor prova de autenticidade, todavia, deve ser íntima e espiritual: se temos falta de sabedoria peçamos a Deus (Tiago 1:5): a verdade será revelada pelo poder do Espírito Santo (Morôni 10:5).
  2. CRITÉRIO TEMPORALIDADE. Quando estivermos interpretando as escrituras e palavras dos profetas precisamos levar em consideração o tempo em que foram proferidas. O conselho de reunir os santos no Vale do Lago Salgado, pro exemplo, já não esta em vigor. O local de Congregação dos Santos é no próprio lugar em que vivem. Esse critério, portanto, nos ajuda a compreender que a palavra de um profeta atual é mais importante que a de um profeta antigo. Claro que isso não se aplica aos princípios extraídos dos próprios ensinamentos: o que era verdade na época de Adão é verdade hoje. Mas os mandamentos, doutrinas, etc. - mudam de acordo com a vontade e sabedoria de Deus: a Palavra de Sabedoria na época de Moisés proibia carne de porco - hoje não há essa restrição, apenas sendo aconselhado que se coma pouca carne (D&C 89:12). Deus trabalha de acordo com a fé dos homens e as circunstancias que eles se encontram (2 Néfi 27:23). O critério de temporalidade, em termos práticos, eleva a revelação moderna acima da revelação antiga. Tal ensinamento é ilustrado na seguinte história:
    “Quero contar o que aconteceu em uma certa reunião a que assisti na cidade de Kirtland na minha juventude. Naquela reunião foram ditas certas coisas (…) a respeito dos oráculos vivos e da palavra escrita de Deus. (…) Um líder da Igreja se levantou e falou a respeito do assunto, dizendo: ‘Vocês têm a palavra de Deus diante de vocês aqui na Bíblia, no Livro de Mórmon e em Doutrina e Convênios; vocês têm a palavra de Deus, e vocês que dão revelações devem dá-las de acordo com esses livros, porque neles está escrita a palavra de Deus. Devemos restringir-nos a eles’.
    Quando ele terminou, o irmão Joseph virou-se para o irmão Brigham Young e disse: ‘Irmão Brigham, quero que você suba ao púlpito e nos diga qual é o seu ponto de vista referente aos oráculos vivos e a palavra escrita de Deus’. O irmão Brigham foi até o púlpito, pegou a Bíblia e a colocou na sua frente; pegou o Livro de Mórmon e o colocou na sua frente; pegou o livro de Doutrina e Convênios e o colocou na sua frente, então disse: ‘Aqui está a palavra escrita de Deus para nós, referente à obra de Deus desde o princípio do mundo, quase, até nossos dias’, disse ele. ‘Mas quando comparados aos [oráculos] vivos, esses livros nada significam para mim; esses livros não transmitem a palavra de Deus diretamente para nós, como as palavras de um Profeta ou de um homem que possui o Santo Sacerdócio em nossos dias e em nossa geração. Prefiro ter os oráculos vivos a ter todos os escritos dos livros’. Esse foi o rumo que tomou o seu discurso. Quando terminou, o irmão Joseph disse para a congregação: ‘O irmão Brigham disse-lhes a palavra do Senhor e disse-lhes a verdade’.” (Wilford Woodruff, Conference Report, outubro de 1897, pp. 22–23; pontuação modernizada; divisão de parágrafos alterada.)
  3. CRITÉRIO HIERÁRQUICO. Por este critério podemos classificar as escrituras em graus de relevância. Primeiro isso é feito pelo critério já apresentado: as escrituras mais novas tem precedência sobre as mais antigas. Segundo: passagens doutrinárias superam passagens meramente históricas ou sem conteúdo essencialmente espiritual. As longas genealogias em Crônicas tem bem menos importância que o ensinamento de 2 Crônicas 20:20, que fala sobre cremos em profetas. É óbvio que toda escritura tem seu proveito - através das genealogias, pro exemplo, podemos verificar a ancestralidade do Salvador - e aprender a importância de se preservar registros familiares. Todavia, pelo critério hierárquico somos instigados a separar as pérolas mais preciosas. Esse exame é subjetivo, pois cada pessoa poderá classificar as passagens que mais lhe são relevantes de acordo com suas necessidades. Uma passagem pode ser extremamente significativa para uma pessoa, em dado momento de sua vida, e não ter a mesma valoração em outro momento. Devo dizer ainda que nem toda passagem das obras-padrão (cânone de escrituras escritas) é revelação de Deus. O livro de Cantares de Salomão, por exemplo, não é inspirado.
  4. CRITÉRIO DA ESPECIALIDADE. Este critério sugere que partes da escritura sejam separados e vistos de modo diferenciado, não apenas como hierarquicamente superiores ou inferiores - como falamos acima: mas como parte ou não de um conjunto maior de escrituras. Por exemplo: Os livros de Mateus, Marcos, Lucas e João - são vistos como "os Evangelhos" - uma parte separada das demais, que trata especialmente do ministério terreno do Salvador. 1 Néfi, 2 Néfi, Jacó, Enos, Jarom e Ômni formam as placas menores, enquanto os demais livros do Livro de Mórmon, com exceção de Éter, Palavras de Mórmon e Morôni - formam um resumo das Placas Maiores. Essas "blocos" divisores das escrituras ajudam na interpretação pois revelam similaridades e contextualizações úteis para o alcance do verdadeiro significado.
  5. CRITÉRIO DA CENTRALIDADE. Este talvez seja o mais importante critério interpretativo. Toda escritura e simbolo no evangelho pretende apontar para Cristo e Sua obra (excetuando-se as passagens meramente históricas, desprovidas de ensinamentos e símbolos). Alguns se sentem incomodados com um critério centralizador, mas, o fato é que se não estudarmos as escrituras procurando Cristo estaremos perdendo muito do real significado da Palavra de Deus. "E falamos de Cristo, regozijamo-nos em Cristo, pregamos a Cristo, profetizamos de Cristo e escrevemos de acordo com nossas profecias, para que nossos filhos saibam em que fonte procurar a remissão de seus pecados." (2 Néfi 25:26). Assim, a serpente de metal levantada por Moisés era mais do que uma serpente de metal: significa Cristo. 
  6. CRITÉRIO DA HARMONIA. Por este critério somos levados a estudar as escrituras em conjunto: verificando todas as obras-padrão e palavras dos profetas vivos. A harmonia entre as escrituras é alcançada plenamente, porém, pelo estudo diligente e pelo poder do Espírito Santo. Trata-se de um critério de integração. A ordem, aparentemente cruel, que Jeová dá a seu povo, de, ao ingressar na terra prometida, matar homens, mulheres, crianças e animais - é explicada satisfatoriamente em outas passagens, por exemplo: 1 Néfi 17:33-34. Esse critério da harmonia não impede revelação nova, mas a revelação nova não inova em princípios - pois os mesmos são sempre harmônicos no evangelho. Tal decorre do atributo divino de Deus: que é de eternidade em eternidade o mesmo.
  7. CRITÉRIO DA TESTEMUNHA. Nada mais é do que a expressão da lei de testemunhas de Deus - que determina que toda verdade seja confirmada por duas ou mais testemunhas (II Coríntios 13:1). Também é um desdobramento do critério da autenticidade, mostrado mais acima. Por este critério as verdades Bíblicas são confirmadas e atestadas pelo Livro de Mórmon - e vice-versa. O fato de Cristo suar sangue não é apenas relatado em Lucas, mas também pelo Rei Benjamim em Mosias 3:7 e pelo próprio Senhor em Doutrina e Convênios 19:18.

CONCLUSÃO
As escrituras contém a mente e a vontade de Deus. Elas são, em regra, suficientemente claras, pois Deus quer que as entendamos. Porém há vários mistérios (que nos guiam para Vida Eterna) que não são instantaneamente concedidos ao leitor casual. É preciso estudar com diligencia. E neste esforço contar com ajuda celestial. Sem o Espírito Santo dificilmente compreenderemos as escrituras. Métodos  e critérios de interpretação quando aplicados devidamente mostram nosso interesse para aprender a verdade e crescer.
Parafraseando Alma "Se não cultivarmos a palavra, esperando com os olhos da fé o seu fruto, nunca poderemos colher o fruto da árvore da vida. Se, porém, cultivarmos palavra, sim, cultivarmos a árvore quando ela começar a crescer, com nossa fé, com grande esforço e com paciência, esperando o fruto, ela criará raiz; e eis que será uma árvore que brotará para a vida eterna. E por causa de nosso esforço e de nossa fé e de nossa paciência em cultivar a palavra para que crie raiz em nós, eis que pouco a pouco colheremos o seu fruto, que é sumamente precioso, que é mais doce que tudo que é doce, que é mais branco que tudo que é branco, sim, e mais puro que tudo que é puro; e iremos nos banquetear com esse fruto, até nos fartarmos, de modo que não teremos fome nem teremos sede. Então colheremos a recompensa de nossa fé e de nossa diligência e paciência e longanimidade, esperando que a árvore nos dê fruto." (Alma 32:40-43)

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